terça-feira, 9 de setembro de 2008

Vício

Porto Alegre, 07 de julho de 2008.
Por meses desde a última vez, o viciado se julga limpo.
Passou pelas crises de abstinência. Sente-se digno de entrar no céu.
Mas numa tarde de inverno, triste frio das almas solitárias, sem querer é posto à prova, cara a cara com ele: o vício.
As pernas tremem, as mãos irrequietas, o coração pulsa descompassadamente. Sim, é uma crise. E das grandes!
Como primeira atitude, a negação de seus desejos, a insistência em permanecer livre enquanto os tremores aumentam.
O viciado se esconde, busca um contato maior com a droga que conhece bem e cujas sensações ainda lhe causam arrepios.
Ele balbucia seu nome, anseia pelo reencontro e nega, nega com veemência todos estes sentimentos.
Conhece bem os sintomas. A euforia, a diversão, o desejo desesperado e a vontade de nunca mais parar. Mas, sobretudo, ele conhece a overdose, a depressão pós consumo, seu organismo se consumindo por dentro de dor, de raiva, de arrependimento...
Ele sabe que não vale a pena. Ele sabe que viver bem é muito mais importante e gratificante... Ele sabe os prós e os contras (principalmente os contras)... O desejo e uma infinidade de conseqüências ruins...
E mesmo assim ele sucumbe e se entrega ao vício. Lambuza-se, abusa, diverte-se e sente-se feliz por poucos minutos como se valessem uma vida.
Sucumbe sabendo que erra, que jogou tudo fora... Que deixou de lado aquilo que mais ama, pelo vício.
O vício de entregar-se de corpo e alma ao que é desejo, ao que é jogo, ao que não é real.
E de pessoa de bem, apta a ir para o céu, retorna à sua posição de viciado.
Viciado no que é bom, mas não alimenta, deseja, mas não supre lacunas, ama, mas não com a alma.
Viciado naquilo que parecia passageiro, mas que mês após mês teima em acomodar-se dentro dele.